íntegra
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - COMARCA DE SÃO PAULO - FORO CENTRAL CÍVEL - 1ª VARA DE REGISTROS PÚBLICOS
Processo nº: 1049929-83.2017.8.26.0100
Classe - Assunto Pedido de Providências - Tabelionato de Protestos de Títulos
Requerente: Brb Qam Fundo de Investimento Em Participações Imobiliário Paraná I
“Protesto - Convenção das partes sobre o local de pagamento – diferença entre local de pagamento das obrigações e local de execução das obrigações - artigo 327 CC e 27, da Seção II, Capítulo XV, das Normas de Serviço da E. Corregedoria Geral da Justiça - pagamento a ser efetuado no local indicado expressamente no título - independência do Oficial para qualificação do título - ausência de impugnação de todos os itens constantes na nota devolutiva - Pedido prejudicado”.
Vistos.
Trata-se de pedido de providências formulado pelo 8º Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital a requerimento de BRB QAM Fundo de Investimento em Participações Imobiliário Paraná I, a qual pretende o protesto de duas escrituras de debêntures. A qualificação negativa foi motivada por: a) ausência de boletins de subscrição e recibo de integralização; b) o documento é protestável na comarca da agencia bancária do credor, conforme item 4.10 do documento apresentado; c) ausência de planilha de débito com identificação das partes que assinaram pelo credor; d) falta de comprovação da exigibilidade do crédito, nos termos do item 4.8 do mencionado documento; d) ausência de CNPJ da emissora.
Juntou documentos às fls.03/299. Insurge-se a interessada somente acerca do item “b”, referente à Comarca na qual deverá ser realizado o protesto, concordando com os demais itens. Alega que no item 4.10 das escrituras de debentures ficou estipulado que a obrigação de pagamento das debentures pela emissora seria mediante o envio de transferência eletrônica disponível (TED) para a conta corrente do requerente, que foi aberta em agencia bancária sediada em Brasília/DF, razão pela qual o Tabelião entendeu que o lugar de pagamento e protesto das debentures seria o Distrito Federal. Ocorre que referida transferência deve ser executada apenas a partir da Comarca de São Paulo, nos termos do item 15.9 do documento. Logo, há dois locais de pagamento, quais sejam, aquele da conta bancária do Fundo, aberta em agencia do BRB sediada em Brasília e o da Comarca de São Paulo, na qual as obrigações de pagamento devem ser executadas. Por fim, salienta que o protesto na Comarca de São Paulo é o mais apropriado para atingir seus objetivos, uma vez que se localiza na capital paulista a sede da emissora.
O Ministério Público opinou pela prejudicialidade do procedimento e, no mérito, pela procedência da dúvida (fls.307/310 e 337).
Nova manifestação do Tabelião às fls.332/333, corroborando os argumentos expostos na inicial.
É o relatório. Passo a fundamentar e a decidir.
Na presente hipótese houve impugnação parcial das exigências formuladas pelo Registrador. Observo que a interessada insurgiu-se apenas em relação ao item “b”, concordando com as demais exigências. A concordância parcial com as exigências do Oficial prejudica a dúvida ou o pedido de providência, que só admite duas soluções: a determinação do registro/averbação do título protocolado e prenotado, que é analisado, em reexame da qualificação, tal como se encontrava no momento em que surgida dissensão entre a apresentante e o Oficial de Registro de Imóveis; ou a manutenção da recusa do Oficial. Para que se possa decidir se o título pode ser registrado ou não é preciso que todas as exigências e não apenas parte delas sejam reexaminadas pelo Corregedor Permanente. Nesse sentido, é pacífica a jurisprudência do Egrégio Conselho Superior. E ainda que assim não fosse, no mérito verifico que o pedido de providências é improcedente, senão vejamos: Conforme estabelecido no artigo 327, “caput”, do Código Civil: “Efetuar-se-á o pagamento no domicílio do devedor, salvo se as partes convencionarem diversamente, ou se o contrário resultar da lei, da natureza da obrigação ou das circunstâncias” (g.n)
O local do cumprimento do contrato, em regra, está indicado no título constitutivo do negócio jurídico, ante o princípio da liberdade de eleição, pelo qual os contraentes são livres para especificar o domicílio onde serão cumpridos os deveres e os direitos resultantes do contrato, bem como determinar o foro competente para dirimir conflitos decorrentes inadimplemento das obrigações. Pela análise dos termos estabelecidos pelas partes, entendo que na presente hipótese foi constituída uma obrigação portável, cabendo ao devedor ir ao encontro do credor para realizar o pagamento, em local aventado previamente. De fato, o item 15.9 das escrituras de debêntures (fl.283), dispõe do foro de São Paulo para a execução das obrigações, que é divergente do local de pagamento: “item 15.9: Fica eleito o foro de São Paulo, Capital, com a renúncia a qualquer outro, por mais privilegiado que seja, para dirimir as questões, dúvidas ou controvérsias porventura oriundas desta Escritura de Emissão e para a execução das obrigações de pagamento previstas nesta Escritura de Emissão”.
Todavia, o item 4.10 é cristalino em relação ao local de pagamento: “Pagamento: O pagamento do Valor Nominal Unitário das Debêntures será realizado pela Emissora, até a Data de vencimento, acrescido da atualização monetária, juros e participação nos resultados do empreendimento, mediante envio de TEF diretamente para a conta do FIP BRB QAM Paraná I, CNPJ nº 16.720.629/0001-46, no Banco Regional de Brasília, nº 070, Agência 0027, Conta nº 027037101-0.
Neste contexto, ainda que transferência deva ser executada apenas a partir da Comarca de São Paulo, enviada à conta do Fundo, sediada em Brasília, não poderia a interessada afirmar que existem dois locais de protesto do título, sendo que nos casos de pagamento realizados em agencias bancárias, o local destas que define a Comarca do protesto do título.
E ainda, de acordo com o capítulo XV, seção II, item 27 das Normas de Serviço da Egrégia Corregedoria Geral da Justiça: “27. Somente podem ser protestados os títulos, as letras e os documentos pagáveis ou indicados para aceite nas praças localizadas no território da comarca. 27.1. Quando não for requisito do título e não havendo indicação da praça de pagamento ou aceite, será considerada a praça do sacado ou devedor ou, se não constar essa indicação, a praça do credor ou sacador. 27.2. O protesto especial para fins falimentares será lavrado na circunscrição do principal estabelecimento do devedor. 27.3. Os títulos executivos judiciais podem ser protestados na localidade de tramitação do processo ou na de domicílio do devedor.”
Tal questão já foi objeto de julgamento pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, nos processos nºs 2011/156750, 2012/41828 e 2012/13869, cujo relator foi o Corregedor Geral da Justiça à época Drº José Renato Nalini: “Protesto de Títulos e Documentos de dívida -Lugar do pagamento - Agencia bancária - Convenção expressa pelas partes - Dívida portável - Localização definidora do Tabelionato de protesto competente”
Confira-se no corpo do Acórdão mencionado: “Jorge César Ferreira da Silva, ao enfrentar a pluralidade de fôrmas de pagamento, robustecida pela disseminação dos meios eletrônicos de pagamento, determinante da progressiva perda de importância dos deslocamentos físicos das pessoas, viabilizada pelo encurtamento virtual das distancias, pontua, com propriedade, quando discorre sobre o lugar do pagamento: De muito maior significado é o fato de o lugar do pagamento determinar se a prestação em questão pressupõe, para que seja realizada, o ato de procurar o credor para pagar ou de procurar o devedor para receber. Em outras palavras, se cabe ao devedor fazer chegar ao credor o pagamento (competindo a este estar apto a recebê-lo) ou se cabe ao credor buscar a prestação junto do devedor (que, nesse caso, deverá estar apto a prestar)”.
Daí conclui-se que a Comarca a ser protestado o título apresentado é determinada pelo local do cumprimento da obrigação aventada pelas partes e não do local da execução das obrigações.
Logo, entendo que devam ser mantidos os entraves.
Diante do exposto, julgo prejudicado o pedido de providências formulado pelo 8º Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital, a requerimento de BRB QAM Fundo de Investimento em Participações Imobiliário Paraná I, com observação.
Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.
Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.
P.R.I.C.
São Paulo, 14 de setembro de 2017.
Tania Mara Ahualli
Juíza de Direito