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Consulta Técnica

PROTESTO – CONTRATO DE LOCAÇÃO – FINS FALIMENTARES – CONTRATO MISTO. TÍTULO – LIQUIDEZ.

30 de junho de 2020

S/N  São Paulo  30/01/2004  Fátima Vilas Boas Cruz  Indefinido  Lei de Falências, art. 1º.

Protesto de contrato de locação para fins falimentares. Pacto complexo que envolve obrigações de naturezas diversas e sujeito à interpretação e prova. Ausência de liquidez do título. Inviabilidade do protesto . Recurso improvido.

íntegra

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça

Trata-se de apelação interposta por CABBAGE DO BRASIL S/C LTDA. contra a decisão de fls. 28/31 que negou o protesto do contrato de locação e recibo de aluguel, reconhecendo válido o ato do Oficial do Quinto Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Capital, por entender ausente o requisito da liquidez do título.

Sustenta a recorrente que o contrato preenche o requisito da liquidez, fazendo jus à formalização da impontualidade em relação ao valor mínimo estipulado pelas partes, a fim de exercer seu direito de crédito via ação executiva.

O Tabelião manifestou-se às fls. 25/26.

É o breve relatório.

Passo a opinar.

A recorrente objetiva o protesto de um contrato de locação firmado com Bachar Mohamed Salim Bazzi, para fins falimentares, tendo em vista a falta de pagamento dos aluguéis avençados. Sustenta que o título se reveste dos requisitos necessários ao protesto .

A Corregedoria Geral de Justiça já firmou posição no sentido de que o protesto é instituto típico de direito cambiário e falimentar, sendo que quanto aos documentos para os quais não exista previsão legal específica do protesto, apenas para fins falimentares ele pode ser efetuado. Porém, desde que preenchidos os requisitos da liquidez, certeza e exigibilidade.

No caso em tela, a recorrente pretende o protesto de um contrato subscrito por duas testemunhas, o qual, se revestido dos requisitos acima citados, caracteriza-se em tese como título executivo extrajudicial sujeito a protesto falimentar.

O artigo 1º da Lei de Falências dispõe que se considera falido o comerciante que não paga no vencimento, sem razão relevante, obrigação líquida constante de título que legitime ação executiva.

A impontualidade do devedor caracteriza o estado de falência. Entretanto, a lei limita o conceito de impontualidade, estabelecendo que ela ocorra no pagamento de obrigação líquida.

Conforme afirma Rubens Requião "salvo os títulos executivos judiciais, a liquidez do título se expressa pelo reconhecimento da obrigação do devedor, ou ao menos pela sua assinatura" (Curso de Direito Falimentar, 1º Volume, 16ª edição, Editora Saraiva).

Miranda Valverde apresenta um critério restritivo na conceituação de liquidez para fins falimentares. Segundo ele, algumas obrigações, embora possuindo executividade, não constituem títulos líquidos, chegando a incluir nessa categoria os créditos decorrentes de aluguel. Ensina o autor que: "Não é, pois, a ação executiva, que a lei processual também estabelece para a cobrança de certas dívidas, que confere a estas, segundo a Lei de Falências, o requisito de liquidez. Não basta ter direito à ação executiva; é necessário que o título protegido por essa forma de ação seja líquido" (Comentários à Lei de Falências, Forense, 1955).

No caso em questão, o título apresentado a protesto é um contrato misto, que engloba diversos encargos recíprocos, o qual não expressa uma obrigação líquida, mas sim que depende de interpretação contratual e prestação de contas, imprestável, pois, para a formalização da impontualidade.

Mesmo quanto à renda mínima estipulada não se sabe se decorre de aluguel ou de participação nos lucros. Além disso, o próprio contrato estipula que tal renda mínima seria reajustada de acordo com o cenário do ano de 2003 e 2004, o que reforça a tese ora esposada.

À falta do preenchimento do requisito liquidez, inviável o protesto do título, devendo-se manter a sentença proferida ora atacada.

Portanto, o parecer que me permito, respeitosamente, submeter ao elevado exame de Vossa Excelência é no sentido de ser negado provimento ao recurso para manter a decisão proferida pelo MM. Juíz de Direito Corregedor Permanente do Quinto Tabelião de Protesto de Letras e Títulos da Comarca da Capital, que reconheceu certa a recusa do Tabelião de efetivar o protesto do contrato de locação.

Sub censura.

São Paulo, 30 de janeiro de 2004.

FÁTIMA VILAS BOAS CRUZ

Juiza Auxiliar da Corregedoria