A diretora de Pessoas Jurídicas da Associação dos Notários e Registradores do Estado de Mato Grosso (Anoreg-MT), Glória Alice Ferreira Bertoli, foi a entrevistada da noite desta terça-feira (23 de fevereiro) do Projeto Memórias, que tem como finalidade apresentar a história de vida de cada profissional e todas as ações realizadas pelas serventias mato-grossenses.
O entrevistador e idealizador do projeto, tabelião substituto do 2º Ofício de Pedra Preta, Wagner Melo, iniciou a entrevista perguntando sobre a trajetória de vida de Glória Alice. “Tudo começou com meus antepassados. Tenho avós, cuiabanos de raiz, e meu pai, em 1933, foi escolhido pelo interventor Leônidas Antero de Matos para ser promotor de justiça em Poconé. Ele foi a Poconé, conheceu minha mãe, casaram e foram para o Pantanal. Desanimado com a vida rural, voltou à cidade e foi nomeado por Julio Strubing Muller, em 1938, como tabelião de notas do 1º Ofício de Cuiabá. Em 1949, nasce a dona Glória, a sexta filha da família. Tive um problema de saúde (meningite pós-parto) e só me fiz viva e com saúde graças à minha madrinha, que, com muita fé, pediu a Deus que eu ficasse boa, sem sequelas”.
Ela acrescentou que seu desejo, inicialmente, era cursar psicologia, mas sua mãe não a deixou estudar fora, determinando a ela que ficasse para ajudar seu pai no cartório. “Eu, louca pelo meu pai, fiquei. Só que eu era muito tímida. Então, fui fazer curso preparatório para seguir no cartório, bem como estágio num banco, em 1968. Fui, por 10 meses, bancária, trabalhando no balcão. Foi então que fui me libertando da timidez. Ainda em 1968, fui para o cartório, onde comecei escrevendo nos livrões de títulos e documentos de pessoas jurídicas, passando para escrevente juramentada em 1969. Após, em 1987, fui nomeada como 1ª tabeliã. Também exerci meu direito garantido pela Emenda Constitucional nº 22, aproveitando o concurso do meu pai, ascendendo à titularidade”.
Gloria Alice registrou que seu pai, Carlos Ferreira da Silva, teve papel importante para os notários e registradores do Estado, fundando o Colégio Notarial do Brasil Seção Mato Grosso. “Um colega dele, tabelião de Aquidauana, chamado Arsenio Serrou Camy, veio a Cuiabá e o convidou a fundar o Colégio. Todos aqui da reunião se reuniram e fundaram o Colégio”.
Quanto às principais dificuldades enfrentadas no início da carreira, Glória Alice pontuou a falta de conhecimento em administração. “O cartório não envolve somente a área do direito, mas, também, administração de processos, finanças, pessoal. Me vali muito dos cursos do Ceag, depois Sebrae. Devo ter uns 50 cursos pequenos de administração. Eu também mantinha o costume de participar de congressos, simpósios e encontros para ficar sabendo sobre tudo o que se passava no nosso mundo profissional”.
Questionada sobre como avalia o futuro dos cartórios, a diretora de Pessoas Jurídicas da Anoreg-MT salientou a importância dos serviços prestados de forma eletrônica, mas também fez questão de enaltecer que a confiança, a aproximação com o ser humano, será sempre necessária. “Nos casos dos testamentos, por exemplo, é preciso fazer entrevista com a pessoa para sentir qual é o anseio dela, pois, no nosso direito pátrio, a família já é preservada pela lei. No entanto, quando ouço alguém dizer que quer fazer um testamento, vou aprender muito mais sobre o ser humano do que se eu tivesse num consultório de psicologia, eis que é um desfile de todas as mazelas humanas quando somos procurados para fazer esse documento. Temos que ter jogo de cintura para aclarar as situações, para não dar problemas. Às vezes, o ato pode criar mais problemas”.
Sobre as sugestões de melhoria para os cartórios, Glória Alice exaltou que é necessário aperfeiçoar os atendimentos, ou seja, haver cursos incessantes sobre comportamentos. “Além de ser para o atendimento ao cliente em si, também servirá para a ascensão do próprio funcionário que, às vezes, não tem muita motivação. E como motivar? Aí é que entram os profissionais de diversas áreas. É necessário, e muito, pois, o estudo de desenvolvimento técnico, de legislação, é mais fácil e corriqueiro. O mais difícil é o comportamento”.
Mudança na atividade
Indagada sobre o que mudaria na atividade, a titular do 1º Ofício de Cuiabá frisou que seria importante alterar a Lei nº 8935/94, que regulamenta a profissão. “Ela é frágil, esgarçada. Exemplo: quando a pessoa é pega em flagrante, nem repreensão tem, já é perda de delegação, atos extremos. Faz tempo que eu vejo, com meu advogado, problemas com colegas que, por uma falta boba, perdem a delegação. Tem 20, 30 anos de lisura e, por uma falha, sai sem honra e dignidade nenhuma”.
Curiosidade
Glória Alice contou, ainda, que certo dia, ao embarcar num avião, no aeroporto de Cuiabá, percebeu um ‘reboliço’. “Me levantei, fui ao banheiro, quando perguntei a um rapaz quem estava se mostrando. Foi quando a Mara Maravilha se apresentou. Eu disse que não a conhecia e ela deve ter ficado muito furiosa”.
Mensagem aos colegas e colaboradores
“Chegamos a um ponto da humanidade que precisamos pensar em sermos colaborativos. Se não formos assim, vamos, como ser humanos, extinguir da Terra. Não há espaço para cada um ficar como uma ilha, principalmente em tempos de pandemia. Temos que nos aproximar das pessoas e sermos humildes na hora de pedir auxílio. Eu tenho a obrigação de dar, mas a pessoa também tem que pedir. Precisamos ter atenção para sermos mais unidos em prol de nós mesmos. Meu sonho de futuro é que todas as instituições (Anoreg, Sinoreg, Arpen, Irib, dentre outras) se tornem um único colegiado”, registrou Glória Alice.
Bate bola
Por fim, Glória Alice fez um bate bola com Wagner Melo. Confira:
Time de futebol: “Na minha casa, quando meus meninos eram pequenos, eram todos São Paulo. Falei que é muito chato só um time numa casa. Não sou do São Paulo, sou da macaca, apenas para fazer um contraponto. Sou da macaca e torcemos pelo Cuiabá”.
Hobbie: “Ficar calada, quieta no meu canto”.
Música: “Bolero, de Ravel. Gosto de músicas mais clássicas e até mesmo as mais modernas. Instrumental”.
Comida: “Pequi com frango caipira e arroz integral. Carne picadinha com banana madura”.
Ídolo: “Jesus Cristo”.
Livro de cabeceira: “Hoje, gosto de ler sobre a vida dos santos, São Francisco, São João da Cruz, para ver como eles se santificaram”.
Uma frase: “Viver e não ter a vergonha de ser feliz”.
Sonho: “Profissional, é ver a classe mais unida, bem conduzida. Pessoal, é ter uma casa que acolhesse pessoas de idade”.
Lugar para viajar: “Adorei conhecer a Ilha da Madeira e gostaria de voltar lá”.